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segunda-feira, 27 de julho de 2020

UM VELHO EU.



_Sente se meu jovem, puxe uma cadeira e proseie comigo por alguns minutos.

Com uma voz amigável, olhar vivo mas que já mostravam os anos de cansaço, aquele senhor me fazia um convite simples o qual não  pude nega-lo.

Sentei-me e lhe ouvi atentamente como quem tem curiosidade de saber se havia lucidez naquele homem, ou se a velhice já lhe tinha negado o prazer de manter uma conversa franca, contínua e lúcida.

Com sua fala pausada ele iniciou um assunto, enquanto isso, eu me acomodava numa cadeira de plástico à sua frente.

_Jovem, a idade avançada chegará para todos e quando a gente se dá conta já se passaram décadas, anos e gerações. É como que num susto que a gente percebe que já não tem mais tantos anos de vida pela frente, é como se estivéssemos dormido e acordássemos  velho, com rugas e sem a vitalidade de antes.

Eu o ouvia atentamente  e por um momento imaginei que a conversa tomaria o rumo de apenas ser mais uma conversa saudosista de um idoso que vive num tempo que não é mais o seu. Foi quando então ele passou a tocar num ponto sublime, transcendente, aquelas falas que se assiste em filmes, dignas de peças filosóficas capazes de nos abrir os olhos e nos fazer enxergar rumos, caminhos, mudar o rumo e endireitar nossas veredas. 
Entre uma pausa e outra, o Idoso continuou.
_A nossa existência se passa como um sopro e nós cansamos.
Quantas caminhadas inúteis eu trilhei, quantos fardos desnecessários carreguei e quantos sentimentos tóxicos eu engoli tentando me saciar durante minha jornada.
Felizes, meu caro amigo, felizes são os que se dão conta daquilo que é desnecessário e se desfazem de coisas inúteis enquanto andam, enquanto caminham essa jornada em pleno vigor da vida.
Hoje, já na casa dos 70 anos, me encontro pacificado com a vida e comigo mesmo. Mas até chegar aqui eu tive que trilhar um caminho de volta pra dentro de mim mesmo.
Tive que pedir perdão por causa dos meus egos. Quantas guerras travei, crendo serem guerras santas, que na verdade eram guerras egoístas. 

Tive que me perdoar e pedir perdão aos que feri nessas batalhas inúteis.

Levantei bandeiras, segui movimentos, franqueei minha fé. Lutei dias, anos, décadas buscando arregimentar gente pra minha denominação religiosa, pois cria piamente que o reino de Deus e sua vontade só se faziam presentes na nossa agremiação. Enquanto isso, não valorizei nem enxerguei o amor de Deus sendo revelado no acolhimento despretensioso, caridoso e afável me concedido por aqueles os quais eu tentava converter à minha religião. Os via como perdidos, impuros, carentes do perdão, quando em muitos casos, o cego era eu, o perdido em minha arrogância e religiosidade era eu, eu era o que carecia de um coração sensível para ver o amor do Criador se revelar na sua criação.

Me descarreguei de minha arrogância e me senti mais leve.

Percebi que minha espiritualidade intimista, ritualística e preocupada com o que o Criador iria pensar de mim, era uma espiritualidade estéril, sem vida, abortada por si só . Pois era uma espiritualidade midiática, carente da aprovação dos homens, mas que não refletia a essência daquilo que o Criador requer da sua criatura, que é uma espiritualidade cheia de humanidade, capaz de atingir  de forma prática a vida de outras pessoas, espiritualidade que ama por saber que é bom amar e faz o bem por entender que Deus é bom e que Dele sai a fonte de toda bondade. 
Me desfiz do peso da espiritualidade hipócrita, dúbia e sem afeição ao próximo.

Fui deixando os pesos no caminho, e sabe de uma coisa? 
Aquele senhor olhou fixo em meus olhos, com um sorriso Pacífico nos lábios e um brilho no olhos que me pareciam como janelas abertas revelando uma paisagem de sua alma cheia de paz, de cores e de beleza. 
Ele então concluiu:
_Felizes são aqueles que se desfazem de pesos desnecessários nessa existência, que aprendem a ser sinceros deixando o peso de uma  espiritualidade doentia e que na sua juventude caminham pelo caminho da paz, do perdão e do amor. Porque no fim da vida o mais importante sempre será o Amor.

O ENCONTRO COM O MEU EU IDOSO 
Antoniel Rimualdo
São Paulo 25 de Julho.
Inverno, Lua crescente.

segunda-feira, 20 de julho de 2020

TEÓLOGOS: O QUE FAZEM? O QUE ESTUDAM? SÃO ÚTEIS?

Quando as pessoas me perguntam sobre minha formação acadêmica e eu respondo que uma delas é em teologia, a grande maioria reage como quem não tem a menor ideia do que um teólogo faz, ou o seu objeto de estudo.

Não, a teologia não é o estudo de Deus, como alguns sugerem. Isso seria impossível por razões simples, o objeto de estudo do teólogo não é palpável e não se permite ser colocado em um tubo de ensaio de um laboratório.

Então do que se trata a teologia? A teologia estuda as manifestações de Deus na criação e as expressões da espiritualidade na humanidade.

A presunção, orgulho e soberba são características comuns em muitos teólogos que pressupõem deter o conhecimento de Deus. No entanto essas características apenas cegam os indivíduos, os impedindo de enxergarem as multiformes manifestações da divindade entre nós.

O teólogo deveria esvaziar-se da arrogância e sair do mofo dos seus livros e pisar com os pés descalços no chão molhado para sentir o cuidado do criador na chuva que cai.

Teólogos deveriam, antes de se aprofundarem nos dogmas e doutrinas de uma religião, se lançar a fazer poesia sobre a dor de uma saudade, sobre a perda de um ente querido, deveriam ouvir os que choram e aprender a se alegrar com o contentamento, ao invés de gananciar status, poderes e bens.

O teólogo é como um cego que tateia os sinais gravados em um livro, e assim ir se deslumbrando e percebendo o Criador.

O teólogo só é útil na sociedade quando ele se integra como parte dela e luta para que os atributos característicos de Deus, como a bondade, justiça e amor sejam estabelecidos entre os humanos. Do contrário, o teólogo se tornará irrelevante, se resumirá a raso repetidor de palavras e ideias que se perderam no tempo.

O teólogo cristão, por sua vez, se caracteriza por levar em sua voz e nas atitudes a mensagem de que o Criador se reconciliou com a sua criação, por meio do seu sacrifício numa cruz.

Antoniel Rimualdo.